
O Ministério Público Federal (MPF) em Rondônia instaurou, em dezembro de 2025, três frentes distintas de atuação administrativa e extrajudicial voltadas ao acompanhamento de políticas públicas e à proteção de direitos considerados indisponíveis pela Constituição. As medidas constam de portarias assinadas por membros do MPF e publicadas no Diário Eletrônico do órgão, envolvendo temas como o atendimento a mulheres vítimas de violência sexual, a proteção de terras indígenas contra práticas ilegais e a garantia de transporte escolar em comunidade indígena.
A primeira iniciativa foi formalizada pela Portaria nº 14/MPF/PRRO/GABPRDC, de 12 de dezembro de 2025, assinada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão em Rondônia, Raphael Luis Pereira Bevilaqua. O ato determinou a instauração de Procedimento Administrativo de Acompanhamento (PA-PPB) com o objetivo de monitorar as políticas públicas adotadas pelo Estado de Rondônia e pelos municípios no atendimento a mulheres vítimas de violência sexual, bem como o cumprimento da chamada Lei do Minuto Seguinte.
O procedimento foi fundamentado em dispositivos constitucionais e em legislação infraconstitucional que atribuem ao MPF a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. A portaria menciona, entre outras normas, a Lei nº 10.778/2003, que estabelece a notificação compulsória de casos de violência contra a mulher atendidos em serviços de saúde; a Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha; e a Lei nº 12.845/2013, que garante atendimento emergencial, integral e multidisciplinar às pessoas em situação de violência sexual. Também são citados decretos e portarias do Ministério da Saúde que tratam da organização da rede de atendimento no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
De acordo com o ato, o procedimento administrativo terá prazo inicial de um ano e visa acompanhar, de forma continuada, a atuação do poder público na implementação dessas políticas, sem caráter de investigação criminal ou cível individualizada. A portaria também determinou a comunicação da medida a órgãos internos do MPF e a designação de servidores para a secretaria dos trabalhos.
Outra frente de atuação foi instituída pela Portaria nº 55/PRM-JPR-2º Ofício, de 16 de dezembro de 2025, assinada pela procuradora da República Caroline de Fátima Helpa. Nesse caso, o MPF converteu uma Notícia de Fato em Procedimento Administrativo para acompanhar medidas educativas adotadas por municípios de Rondônia com o objetivo de conscientizar a população sobre a proibição de caça, pesca e desmatamento em áreas tradicionalmente ocupadas por comunidades indígenas.
O procedimento tem origem em representação da Frente de Proteção Etnoambiental da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), que relatou a ocorrência recorrente de caça ilegal em áreas ocupadas por indígenas isolados na Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, especialmente em regiões próximas ao município de São Miguel do Guaporé. Segundo a portaria, as primeiras diligências envolveram o envio de ofícios às prefeituras de Alvorada D’Oeste, Costa Marques, São Miguel do Guaporé e Seringueiras.
As respostas recebidas indicaram diferentes medidas adotadas. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Turismo de São Miguel do Guaporé informou manter fiscalização ao longo do Rio São Miguel e manifestou a intenção de intensificar ações educativas sobre preservação das terras indígenas e direitos do povo Uru-Eu-Wau-Wau. A Prefeitura de Alvorada D’Oeste comunicou a fixação de banner educativo em seu site institucional. Já o Município de Seringueiras informou que pretende instalar placas informativas nos acessos à terra indígena e divulgar orientações em sua página oficial, solicitando prazo de 60 dias para a execução das medidas. Até a data da portaria, não havia resposta da Prefeitura de Costa Marques, motivo pelo qual o MPF determinou a reiteração do ofício, com prazo de 15 dias para manifestação, sob advertência quanto às consequências legais da omissão.
Além dos procedimentos administrativos, o MPF também instaurou um inquérito civil por meio da Portaria MPF/PR RO/6º Ofício nº 101, de 15 de dezembro de 2025, assinada pelo procurador da República Leonardo Trevizani Caberlon. O inquérito tem como objeto garantir o direito de passagem, o uso do patrimônio público e a oferta de transporte escolar seguro e adequado aos moradores da Aldeia Kajywa, localizada na Linha 18 da Terra Indígena Igarapé Lage, no município de Nova Mamoré.
A medida foi adotada com base em relatório circunstanciado de diligência externa produzido pelo 6º Ofício da Procuradoria da República em Rondônia, unidade que atua em matérias relacionadas aos direitos das populações indígenas, comunidades tradicionais e minorias. A portaria determinou a nomeação de servidores para a secretaria do inquérito e o cumprimento das diligências estabelecidas em despacho específico, com posterior publicação oficial do ato.
As três portarias destacam que os procedimentos administrativos e o inquérito civil são instrumentos próprios da atividade finalística do Ministério Público Federal para o acompanhamento contínuo de políticas públicas e a tutela de direitos coletivos e difusos. Conforme os atos, tais medidas não possuem, em si, caráter de investigação criminal ou de apuração de ilícito individualizado, mas visam assegurar o cumprimento de obrigações legais e constitucionais pelo poder público.
As iniciativas refletem a atuação simultânea do MPF em diferentes áreas sensíveis no Estado de Rondônia, envolvendo direitos das mulheres, proteção ambiental e territorial de povos indígenas e garantia de acesso à educação em comunidades tradicionais, com acompanhamento administrativo e extrajudicial das ações estatais previstas em lei.
Texto originalmente publicado em https://www.rondoniadinamica.com/noticias/2025/12/mpf-de-rondonia-abre-procedimento-para-apurar-e-coibir-pesca-e-caca-ilegais-em-terras-indigenas,234012.shtml. A reprodução é permitida desde que citada a fonte e incluído o link para o artigo original. Respeite os direitos autorais e compartilhe com responsabilidade.